terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Franz Ferdinand: a arte de reinventar

"Quando surgiram no início do novo milénio a partir da nebulosa cidade escocesa de Glasgow muitos apontaram os Franz Ferdinand como a “next big thing” e Alex Kapranos o primeiro profeta do século XXI.

O lugar na história parecia-lhes destinado, ou não tivessem o nome de um arquiduque capaz de despertar paixões e ódios de proporções bélicas à escala mundial e eles fizeram, como poucos, por merecê-lo.

Em 2004 o álbum homónimo de estreia confirmou tudo aquilo que deles se dizia nas antecâmaras da indústria musical e os prémios sucederam-se como consequência lógica de um trabalho irresistível e intemporal.

Diz um famoso provérbio português que “cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém” (alguém traduza isto para inglês) e “You Could Have It So Much Better” segue à risca a sabedoria popular não ousando mudar uma vírgula à fórmula que se revelou triunfante (no caso dos Franz Ferdinand só pode ser positivo, daí que existissem algumas dúvidas por entre a crítica quando Kapranos anunciou uma mudança de sonoridade para o terceiro trabalho).

Comecemos então pelo princípio (foram precisos muitas horas de reflexão para reconhecer esta estratégia como a mais indicada). Na capa do álbum surge um dos elementos inanimados a receber uma massagem cardíaca, provavelmente o “velho de Glasgow” que, de forma metafórica, resiste à transformação anunciada em “Tonight”. Alex Kapranos parece afastar os críticos que esperavam uma oportunidade de detonar um dos projectos mais entusiasmantes dos últimos anos e a verdade é que não há nenhuma razão para isso.

Os Franz Ferdinand não perderam um único gene neste novo álbum, mas acrescentaram-lhe outros para melhor se adaptarem aos novos tempos (muito pertinente quando se comemoram 150 anos sobre a publicação da “Origem das Espécies”, o polémico livro de Charles Darwin). Qualquer fã mais purista encontra em faixas como “No You Girls”, onde nem faltam as palmas a marcar o compasso dominado por uma vincada e hipnótica linha de baixo, ou “Turn It On” razões mais do que suficientes para manter o culto intocável. Estas faixas não destoariam e até enriqueceriam o alinhamento dos registos predecessores, pelo que não é nelas que se revelam as sedutoras idiossincrasias de “Tonight”.

É em músicas como “Ulysses”, o single de apresentação, “Can’t Stop Feeling” ou “Lucid Dreams (a mais ousada das novas composições) que a electrónica ganha protagonismo e aponta um novo rumo para uma carreira que está prestes chegar à primeira década sem o mínimo sinal de desgaste. Nunca caindo em exageros, o recurso aos sintetizadores surge como um acto libertário e de extraordinário bom gosto (é possível que tenham estudado pela cartilha do norte-americano James Murphy), nunca caindo num simplista exercício retro como muitas vezes acontece com as novas bandas.

Para o “epílogo” regressa um Kapranos trovador e de alma dorida. “Dream Again” e “Katherine Kiss Me” são momentos de acalmia e de exorcização de alguns moinhos de vento que atormentam a demanda dos Franz Ferdinand pela reinvenção do rock. E se há alguém capaz de o fazer no início do novo século, são eles.

Ouça todas as músicas em www.musicaonline.pt"


Texto de Bruno Mano. Eu cá subscrevo todas as letras deste texto =)

MOTW: Franz Ferdinand - Can't Stop Feeling